Exposição “Artista Viajante”

A descoberta das Minas em pleno século XXI

Exposição retoma a tradição dos artistas viajantes, atualizando-a nas cenas do imaginário brasileiro

Por Rachel Costa https://clippings.me/keucosta

Em um passado não muito distante – entre os séculos XVII e XIX –, artistas viajantes oriundos de várias partes da Europa correram a América retratando o Novo Continente. Nomes como Rugendas, Debret e Thomas Ender marcaram a história, participando das expedições européias que registraram os primeiros anos de vida do Brasil pós-Independência. Outros, como Hans Staden, alemão que aqui esteve no início do século XVII, foram responsáveis por levar à Europa as primeiras descrições acerca dos nativos americanos, logo após o Descobrimento.

O mistério do desconhecido e a ânsia por desbravar estas terras fizeram com que esses grupos se embrenhassem pelo território em conquista, retratando tanto o que encontravam pela frente quanto o que imaginavam encontrar. Essas pinturas e gravuras, fiéis ou não à realidade observada, servem até hoje como registro histórico do passado americano. Mais do que isso: ajudaram na construção do imaginário sobre o Novo Continente, sua fauna, sua flora e seus habitantes.

A vinda desses artistas é uma experiência pioneira e que mostra a força da arte no processo de registro e de elaboração da realidade. Mas e no mundo de hoje, já tão retratado, seja por pinturas, gravuras, fotografias ou filmes? Há ainda mistérios que um artista viajante pode buscar em suas andanças? Na realidade “big brother”, onde todos estão expostos o tempo todo, onde a imagem se multiplica e se torna banal, há ainda segredos a serem revelados pelo olhar atento de um artista? E se há, onde estão?

A exposição Artista Viajante, que traz cerca de 20 gravuras de Felipe Abranches, se propõe a enfrentar esses desafios. Traço minucioso, pormenorizado, cenas complexas, realidades simples. A fórmula remete àqueles primeiros artistas viajantes, mas em um contexto atualizado e regional. A proposta agora é buscar, no interior de Minas Gerais, o detalhe, o momento crucial, em um resgate da cultura popular do estado. Vampiro-morcego, garimpeiros, Iara, tropeiros: o imaginado se mescla com o histórico e ganha contornos bem mineiros nas obras selecionadas para a exposição.

Uma pequena parte do acervo à mostra, formado por três figuras da mitologia grega, faz parte das pesquisas que levaram o artista ao trabalho atual, dedicado aos temas do imaginário do País. Outras três formam o Pequeno bestiário fantástico da fauna brasileira, espécie de apêndice da exposição Artista Viajante, no qual as temáticas guardam relação com a proposta geral, mas as imagens não compõem cenas narrativas, mas apenas ilustrações das figuras da Iara, do Jurupari e do Guaravá (criação de Felipe em que homem e lobo-guará se mesclam em uma figura única).

A outra parte, composta pela maioria das obras expostas, é dedicada às cenas narrativas e se divide entre o tríptico Chica Dona, que mescla a cachoeira que dá nome ao quadro, com a paisagem de cerrado e a rotina dos tropeiros; a série Demandas de minha fazenda, composta por três imagens – o Lobisomem atacando o galinheiro, o Vampiro atacando o pasto e a Iara no ribeirão –; Chegança, que retrata uma fazenda de Minas Gerais; Rio das Carpideiras, onde três senhoras chorando atravessam um rio largo (detalhe para a ponte em estilo colonial ao fundo), em um barco, remetendo à travessia do Rio Estige (um dos rios do Inferno, na Mitologia Grega); mais quatro imagens do lobo-guará do Parque Nacional do Caraça e dois auto-retratos.

As peças expostas dividem-se entre a técnica da gravura em metal (predominante nesta exposição), as litografias (técnica de registro em que se marca o desenho com lápis gorduroso sobre pedra) e as serigrafias (processo de impressão por meio de telas). O conjunto pode ser visto em Tiradentes até o dia 4 de novembro, no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

SERVIÇO
Exposição: “Artista Viajante”, de Felipe Abranches;
Abertura: 12 de outubro de 2007, às 20h;
Visitações: de 13 de outubro a 4 de novembro de 2007;
Local: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN/ Escritório II) – Rua da Câmara, 124. Tiradentes/ MG.