Reportagem “Viagens Interiores”

Felipe Abranches mostra em Tiradentes gravuras realizadas a partir de suas andanças

Por Walter Sebastião

“Gosto do interior, é algo subjetivo, que nem sei explicar. Para mim, ir a cachoeiras, fazendas antigas, cidades pequenas tem qualquer coisa de autoconhecimento”, conta Felipe Abranches, de 25 anos. Como diz, mesmo morando em Belo Horizonte, desde adolescente ia de bicicleta para outras cidades. Hábito que mantém até hoje. Ele até gosta do contato com a natureza, mas, falando do seu hobby, prefere destacar outro aspecto: “O raciocínio, quando a gente está no meio do mato, passa por outras vias. A maneira de pensar do povo do interior é diferente. Parece que faz a curva da montanha, não é linear como o pessoal da cidade”, observa.

Vêm de anotações feitas durante acampamentos, passeios e visitas ao interior os elementos que Felipe Abranches usa para criar suas gravuras. Uma coleção de 20 delas, em diversas técnicas, está na exposição em cartaz até domingo na galeria do Solar Ramalho, em Tiradentes, que leva o nome de Artista viajante. São imagens dedicadas a cenário, personagens, fauna e à vida interiorana. “É um desenho naturalista e composição trabalhada visando à harmonia nos detalhes e sem elementos desnecessários”, explica. Sua técnica favorita é a impressão com chapas de metal e, portanto, paixão declarada “pela linha apurada, expressiva e refinada, que nenhuma outra técnica artística consegue fazer igual”.

As imagens são produtos de detalhes recolhidos em várias (Serra do Cipó, Rio Acima, Pico da Bandeira, região de Ouro Preto e Mariana) e reunidos numa só obra. O artista avisa que, para curtir o interior, nem é preciso ir muito longe: “Bem perto de Belo Horizonte você ainda encontra animais selvagens, cachoeiras e fazendas que ninguém conhece, cidades que só hoje estão recebendo luz e água”. Mais: “As pessoas acham que a profissão de tropeiro não existe mais. Existe sim. Não é como antigamente, mas muita gente ainda vive de fazer viagens para recolher produtos ao longo da estrada, como queijos, por exemplo, que são levados para serem vendidos em cidades maiores”, afirma.

Ele se formou em gravura em 2006, na Escola de Belas Artes da UFMG. Já participou de várias coletivas e integrou o grupo de artistas de BH que abafou em recente Bienal de Gravura do Mercosul. Dos gravadores que admira cita Rugendas (“é com quem mais me identifico, retrata o Brasil com paixão”); Marcelo Grassmann (“pelo simbolismo”) e Clébio Maduro (“pela técnica, no sentindo de enfrentar e resolver os problemas da gravura”). Feliz da vida com a linguagem eleita para se expressar, Felipe Abranches só lamenta a persistência do preconceito com obras sobre papel e gravura. “Já passou da hora de mudar conceitos”, observa, explicando que os papéis usados em gravura tem qualidade.

ARTISTA VIAJANTE
Mostra de gravuras de Felipe Abranches. Galeria do Sobrado Ramalho, Rua da Câmara, 124, em Tiradentes. Até domingo, das 10h às 17h. Entrada franca.