Chegança

Após dias cruzando as serras de sol a sol, dormindo ao relento e percorrendo longas jornadas, levando e trazendo encomendas, o tropeiro está finalmente de volta à casa. Do lado de fora, a família lhe aguarda com o sorriso de saudade da mulher e o olhar ressabiado da sogra.

Mais uma viagem se completa. É hora de reencontrar a comida fresca recém-saída do forno à lenha, o aconchego da mulher e o conforto da cama macia e quente. A quem vive nas cidades grandes pode parecer tudo muito frugal, mas é esta a vida do tropeiro e são aquele pedacinho de terra bem cuidado e a família forte e unida a razão de sua labuta.

É inegável que o cansaço se faz presente no corpo arqueado do tropeiro e em sua expressão dura feito o minério de ferro. Enquanto ele caminha em passos pesados em direção à mulher, seu assistente, solitário, descarrega os burros ao fundo, em frente à coxia, preparando-os também para o descanso.

O fim do trabalho e o retorno ao povoado marcam também a inserção de elementos arquitetônicos na obra de Felipe Abranches. Se no tríptico “Chica Dona” o cenário de sua narrativa eram paisagens naturais, o centro de atenção agora desloca-se para os pequenos povoados do interior mineiro e suas casas de adobe com telhas de barro e paredes caiadas desbotadas pelo tempo e coloridas pela poeira. Em “Chegança”, a inspiração vem do casario da região da Serra do Cipó, em Minas Gerais.

Ao representar a casa, o autor completa o mosaico de paisagens que compõe a vida dos tropeiros, homens das serras, dos cerrados e das estradas, mas também das vilas. Afinal, essa profissão surge justamente da necessidade secular de transportar produtos de um povoado ao outro: de levar o queijo, trazer a carne e encher as prateleiras dos armazéns com todo tipo de quinquilharia que se possa imaginar.

E, como todo bom viajante, o tropeiro é um homem de partidas, mas, sobretudo, de chegadas.

Ficha técnica
Matriz de ferro de 35×25 cm